Existe uma certa sensibilidade ou sutileza, por vezes incompreensível, uma espécie de perplexidade e misto de prazer e dor em ser um corpo suspenso no mundo. É muito difícil ter alguém que te compreenda nesses espaços de não-dito, nessa surpresa e suspensão permanente. Mas, eu posso dizer que tenho o imenso privilégio de ter a Ana na minha vida, uma pessoa cuja amizade se estabelece nessa rara e preciosa conexão silenciosa, capaz de compreender as nuances dolorosas (e prazerosas) de ser um indivíduo que vê dor e beleza infinita numa existência finita. A seguir, um lindo texto que ela escreveu a partir da leitura do meu livro, O Diálogo, e que eu não poderia deixar de publicar por aqui:
Quando pequena, lembro de ficar angustiada quando percebi que nunca veria o mundo por outro ângulo senão o dos meus olhos. Lembro da sensação muito estranha de perceber que nunca veria mim mesma do lado de fora. Que a minha existência e a minha percepção dela, assim como de todo mundo, está conectada ao interno e nunca ao externo. Essa sensação me persegue há muitos anos, às vezes sinto a imagem no espelho não parecer real, às vezes me sinto diluída, assim como o mundo ao meu redor. Às vezes me questiono sobre a concretude do mundo, uma vez que o mundo e a forma de me ver fazer existir parece sempre subjetiva. O Diálogo, da brilhante Luizza, me fez sentir ouvida — mais uma vez, assim como nossa amizade — nesse espaço de acolhimento do não-dito, das coisas que nem sempre são segredos, como o caso da personagem, mas que nós não nos permitimos dizer. Nesse mundo que não te escura, que não enxerga e não aceita a subjetividade, ainda mais para pessoas que sempre tiveram um diálogo interno, sempre inesgotável, encontrar O Diálogo foi como um abraço de quem entende o sofrimento humano, seja pelas mais variadas causas. O Diálogo é a permissão, permissão para sentir, permissão do encontro da dor, que muitas vezes se instala no nosso corpo e no fim das contas somos indivíduos-dor, somos parte dela, assim como ela é parte de nós. O diálogo acolhe, mesmo que de uma maneira cruel. O espaço de se permitir dizer o que não é possível falar. As abstrações, os sentimentos e a sinestesia de uma existência pálida. Eu só tenho a gradecer a Luizza por permitir ao mundo esse encontro e por me lembrar da força de uma existência arrasada, amparada na tristeza e no acolhimento dela pode ter. Em um mundo tão cruel como o nosso, tão pautado no concreto e no viver mecanizado, o diálogo nos permite a abstração, os sentimentos-cores, os espelhos da vida.